As inscrições para o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) começaram no último dia 11 de maio e vão até o próximo da 22, em meio à polêmica sobre o cronograma da prova durante a pandemia. Com aulas canceladas ou transferidas para o meio virtual, muitos defendem que a prova deveria ser adiada, mas o governo federal até então não deu sinais que seguirá por esse caminho. Por enquanto, as provas impressas deverão acontecer no dia 1º e 8 de novembro, e a versão digital, que estreia esse ano, nos dias 22 e 29 de novembro.
A União Nacional dos Estudantes (UNE), a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), além de universidades e colégios federais, são algumas das entidades que já se pronunciaram a favor do adiamento do exame.
Uma das preocupação é que, durante a pandemia, as condições de estudo e preparo não são iguais para todos – os estudantes de menor renda não terão acesso a uma boa conexão com a internet, computadores, livros e outros recursos importantes ao longo da maior parte do ano letivo. Neste sentido, o acesso ao ensino superior público gratuito seria ainda mais afetado pela desigualdade socioeconômica do que já é normalmente.
O Ministério da Educação lançou uma campanha em vídeo que defende a manutenção das datas do ENEM, com o lema “o Brasil não pode parar”. O vídeo foi rapidamente criticado nas redes sociais e por entidades ligadas à educação, que consideraram a campanha descolada da realidade de uma parte razoável dos estudantes pelos motivos já mencionados.
Como o mundo está lidando
O Brasil não é o único país a enfrentar esse dilema: na maior parte do mundo, as aulas presenciais estão canceladas. Países desenvolvidos com territórios menores conseguem organizar aulas à distância que atendem boa parte dos estudantes, mas mesmo na Europa há um debate sobre os impactos da pandemia no acesso às universidades.
O modelo do ENEM – em que uma prova única garante acesso a quase todas as instituições públicas do Brasil – é raro no resto do mundo. Outros países, principalmente os que tem um sistema de ensino majoritariamente privado adotam sistemas de ingresso diferentes – que, com frequência, não utilizam provas como único critério. Vamos comentar alguns casos:
Os Estados Unidos têm uma prova parecida com o nosso ENEM, chamada SAT, que é padronizada para todo o território (exceto que, por lá, a prova não é o único nem o principal critério de seleção). O exame é aplicado algumas vezes por ano. Com a pandemia, o SAT marcado para o dia 6 de junho foi cancelado, e novas datas foram marcadas. As provas vão rolar mensalmente, começando no fim de agosto e indo até dezembro.
A College Board, instituição governamental responsável pela prova, também deixou claro que as avaliações só serão realizadas a partir de agosto caso as condições de saúde pública permitam. Como a prova acontece várias vezes todos os anos, o debate sobre tempo para preparação não pegou tão forte por lá.
Outro país com prova unificada é a China. Por lá, o ENEM se chama GaoKao, e tem uma certa fama por ser a maior prova do mundo – só neste ano, 10 milhões de estudantes vão participar. O exame permite que os alunos com maiores notas consigam ingressar nas melhores universidade do país, e por isso é levado bem a sério. Graças à pandemia, porém, a prova foi adiada um mês, de junho para julho. Foi a terceira vez na história que a data do exame foi mudada por circunstâncias extraordinárias.
A China foi a primeira atingida pela pandemia, mas agora parece ter controlado a crise (ainda há o temor de uma segunda onda de infecções com a reabertura gradual). Por isso o adiamento foi modesto, de apenas um mês. No país asiático também há um debate sobre as datas: alguns temem que a pandemia tenha afetado principalmente estudantes de comunidades e vilarejos do interior, que têm condições piores de acesso à educação em comparação com os estudantes dos grandes centros urbanos. Mas também houve quem criticou o adiamento: como a rotina de estudos costuma ser bem puxada na China, um mês a mais é sinônimo de esgotamento para os estudantes.
Na França, o famoso baccalauréat foi cancelado pela primeira vez na história desde que foi criado por Napoleão Bonaparte, em 1808. Ao invés desse tradicional vestibular de abrangência nacional, cada aluno receberá uma nota para cada matéria baseada em sua performance durante provas e tarefas durante o ano. Essa solução também foi adotada, com algumas diferenças, pelo Reino Unido: por lá, os exames conhecidos como GCSE e “A-Level” foram cancelados no primeiro semestre e serão substituídos por uma análise geral feita pelos professores com base em informações prévias. Os alunos que não concordarem com as notas recebidas poderão optar por prestar uma prova presencial quando a situação se normalizar.
Outros países foram ainda mais radicais na decisão. Na Indonésia, o governo federal cancelou todos os exames nacionais do país em todos os níveis educacionais por tempo indeterminado – mas, por lá, a admissão em escolas e universidades não depende só de provas, e poderão continuar por outros critérios. A Índia não possui uma prova nos moldes do ENEM, mas várias provas de admissão das principais universidades do país também já foram canceladas ou adiadas.
Vale lembrar, porém, que mesmo nestes países não há consenso sobre o que fazer. Muitas provas foram adiadas por pouco tempo, e alguns adiamentos levaram mais em conta a aglomeração de pessoas durante a pandemia do que apenas sobre as desigualdes na educação, e entidades e ativistas vem cobrando medidas mais radicais neste sentido também nestes países. Ou seja, ninguém tem uma resposta definitiva para os impactos da Covid-19 na educação.
Pelo mundo, países estão cancelando ou adiando seus “ENEMs” Publicado primeiro em https://super.abril.com.br/feed
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