Autópsias revelam que o Sars-CoV-2 causa a formação de células gigantes, com até 15 núcleos; processo transforma radicalmente a anatomia do pulmão, que chega a ficar irreconhecível; fenômeno pode estar relacionado à ação da proteína spike
“Há um grande número de células muito grandes, fundidas, que contêm o vírus e chegam a ter 10 ou 15 núcleos”, revelou o médico Mauro Giacca, da King’s College London, em depoimento ao parlamento inglês na segunda-feira. Ele fez autópsias em pacientes que morreram de Covid-19 e constatou o fenômeno, que transforma radicalmente a arquitetura das vias aéreas: “Dependendo da luz, você não consegue nem distinguir que aquilo era um pulmão”, disse.
Giacca é o primeiro cientista a relatar fusão celular em casos de Covid-19. “Essa informação está largamente ausente da literatura [médica], pois não está havendo autópsias [de mortos pela doença]“, declarou. O procedimento tem sido evitado porque o corpo da vítima pode conter grandes quantidades de Sars-CoV-2, apresentando risco de infecção do médico-legista e do local onde a autópsia é realizada (que precisa ter um sistema de pressão negativa para evitar a saída de ar, filtros e outras medidas de biossegurança).
Ainda não se sabe como o Sars-CoV-2 provoca a fusão de células humanas, mas existe uma ótima pista. Em 1991, cientistas americanos analisaram o MHV4, um coronavírus que infecta o fígado de ratos e também causa fusão celular. Eles descobriram que isso ocorre por causa da proteína spike (S), que o vírus usa para se fundir com as células. Ao infectá-las, o MHV4 começa a usar o maquinário celular para produzir cópias de si mesmo – o que, eis o ponto crítico, inclui fabricar a proteína spike.
Uma certa quantidade dessa proteína acaba indo parar na superfície da célula infectada, onde a substância age de maneira distorcida: em vez de facilitar a fusão do coronavírus com uma célula, ela acaba estimulando a fusão entre células. Outros vírus, como o HIV, o HSV-1 (que causa herpes) e o MeV (do sarampo), também têm esse efeito, por meio de um processo similar.
Em algumas partes do corpo, existem células que se fundem naturalmente: elas são chamadas de sincícios e estão presentes nos músculos, nos ossos e na placenta. É um processo normal e necessário para a formação do organismo – e não têm relação com as fusões anormais provocadas pelo Sars-CoV-2 e outros vírus. Elas podem deformar os tecidos, levando à falência dos órgãos infectados, e também ter uma consequência mais insidiosa. Alguns cientistas especulam que as células fundidas sejam geneticamente menos estáveis e mais sujeitas a mutações – o que poderia explicar a relação entre a infecção por certos vírus, como o HPV e os que causam hepatite B e C, e o surgimento de câncer.
Coronavírus provoca fusão anormal de células humanas Publicado primeiro em https://super.abril.com.br/feed
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