segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Novo método usa cristais para prever potencial destrutivo de vulcões adormecidos

A Terra está repleta de vulcões – são tantos que nem é possível ter uma estimativa confiável do total. Felizmente, a maioria está em estado dormente, ou seja, não entraram em erupção por séculos ou mesmo milênios. Por outro lado, estudar esses vulcões inativos é relativamente difícil, já que não emitem muitos sinais que possibilitem prever uma possível volta à atividade. Isso significa que, numa eventual erupção, estaríamos pouco preparados para a catástrofe. 

Agora, uma equipe de cientistas europeus desenvolveu um novo método para calcular a quantidade de magma armazenada em vulcões inativos. Ele se baseia no estudo de cristais presentes nas rochas vulcânicas. Com isso, é possível prever qual seria o impacto de possíveis erupções próximas a áreas urbanas. O estudo foi publicado na revista Nature

Estima-se que cerca de 800 milhões de pessoas vivam hoje em áreas próximas a vulcões dormentes. É difícil calcular o número exato, pois isso depende do que se considera como “próximo”. A abrangência das erupções varia bastante, sendo que algumas são (bem) maiores que outras. É por isso que grandes tragédias do último século envolvendo vulcões foram tão chocantes – os cientistas não tinham como prever o impacto delas.

É comum que o magma fique estocado a uma profundidade que passa dos dez quilômetros da superfície, o que é praticamente inacessível para a maioria dos estudos. Calcular a quantidade de material que poderia ser ejetado em uma erupção, por sua vez, seria uma métrica importante para se preparar contra novas tragédias.

Pensando nisso, pesquisadores da Universidade de Genebra, na Suíça, criaram uma nova técnica para analisar o potencial destrutivo de vulcões dormentes. Ela se baseia na análise da zirconita (ou zircão), um cristal presente em rochas vulcânicas. A grande vantagem desse mineral é que ele contém urânio e tório. Esse primeiro elemento químico sofre decaimento radioativo, ou seja, libera radiação até se transformar no segundo. O tório, por sua vez, também sofre decaimento ao longo dos anos. O tempo que demora para metade de uma amostra decair e se tornar outro elemento químico é chamado de meia-vida.

O decaimento radioativo de elementos nos permite fazer a datação radiométrica dele – ou seja, calcular a sua idade com base na sua meia-vida. Cada elemento químico possui um tempo de meia-vida específico – no caso do urânio-238, são 4,5 bilhões de anos. Esse processo também acontece com o carbono-14, por exemplo, que é utilizado para calcular a idade de materiais orgânicos muito antigos.

Dessa forma, é possível calcular com precisão o quando a zirconita se cristalizou dentro do vulcão. E aí que vem o pulo do gato: esse mineral só se forma em uma faixa de temperatura específica. Ou seja, analisar o cristal permite descobrir qual era a temperatura no interior do vulcão em determinada época. 

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Estudando várias amostras diferentes, é possível reconstruir uma linha do tempo da temperatura do interior do vulcão. “Esses cristais são algo como um relógio combinado com termômetro”, explica Gregor Weber, autor do estudo, em entrevista à SUPER.

Com essas duas métricas, então, é possível calcular a velocidade de resfriamento do magma do vulcão. E aí entra a segunda grande sacada: existe uma relação entre o volume do material e a progressão de sua temperatura. Uma bacia cheia de água quente, por exemplo, leva mais tempo para esfriar do que um pequeno copo. Usando modelos matemáticos que relacionem essas duas variáveis, é possível descobrir, pela velocidade de resfriamento, se o vulcão em questão é uma xícara de magma ou uma piscina olímpica. 

A metodologia dos pesquisadores foi testada em um dos maiores vulcões inativos que conhecemos: o Nevado de Toluca, também conhecido como Xinantécatl, localizado no México, a apenas 80 km de sua capital densamente povoada. A equipe calculou que existem 350 km³ de magma armazenado na barriga do gigante, mais do que suficiente para causar uma tragédia. Por sorte, o vulcão está inativo há milênios e não dá sinais de que causará problemas. 

A grande vantagem desse novo método é que ele é relativamente simples e pode ser aplicado tanto em vulcões dormentes quanto em ativos. Até existem métodos atuais que estimam a quantidade de magma estocada – como o método magnetotelúrico, a tomografia sísmica e a gravimetria –, mas, segundo Weber, são processos complexos e elaborados que geralmente só são aplicados para vulcões ativos. Além disso, a zirconita é relativamente comum em rochas vulcânicas (outros mineiras, como a allanita e titanita, também poderiam funcionar ajustando a metodologia; no entanto, são bem menos abundantes).

É claro que estimar as proporções da catástrofe pode até ajudar a nos preparar para reduzir danos, mas não serve de muita coisa se não soubermos quando um vulcão vai entrar em erupção. Infelizmente, nesse caso, não há um método 100% confiável para se calcular a data da tragédia.

“Em muitos casos, vulcões produzem sinais mensuráveis antes das erupções, como deformações do solo, terremotos, perda de gás elevada ou mudanças na gravidade”, explica Weber. “Prever uma erupção depende da magnitude e do tempo de tais sinais. No entanto, ambos podem variar drasticamente, e, às vezes, nenhum sinal é detectado.”

Nesse caso, nos resta torcer para que tais vulcões continuem no estado que ficaram por milênios: dormindo.

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