terça-feira, 15 de outubro de 2019

Anvisa diz que remédio para enjoo pode causar males na gravidez: e agora?

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) emitiu um alerta sobre o risco de malformações congênitas relacionadas à ondansetrona, componente usado em remédios como o Vonau, voltados inclusive para enjoos intensos durante a gestação. Enquanto investiga o assunto, a entidade recomenda cautela na prescrição durante o período de gravidez.

No entanto, para especialistas brasileiros, a decisão pode ser precoce. Explicamos: a orientação foi baseada em alguns poucos estudos, em especial um conduzido pela Universidade Harvard, nos Estados Unidos, e publicado em dezembro de 2018 no periódico cientfífico Journal of the American Medical (JAMA).

A investigação comparou mais de 88 mil gestantes expostas à ondansetrona no primeiro trimestre com cerca de 1,7 milhão de grávidas que não a utilizaram. No fim das contas, a incidência de malformações no grupo que tomou a droga foi de 14 casos para cada 10 mil nascimentos, ante 11 na outra turma. Ou seja, três episódios adicionais a cada 10 mil partos.

Segundo os médicos ouvidos pela SAÚDE, essa diferença no risco é praticamente irrelevante. “Com os dados que temos, não dá para saber se realmente há essa relação. Pode ser apenas um acaso estatístico. Nós precisaríamos de estudos mais robustos”, comenta Andre Luiz Malavasi Longo de Oliveira, diretor da Associação de Obstetrícia e Ginecologia de São Paulo (Sogesp).

Em nota, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) adotou o mesmo tom. A entidade destaca em seu texto que as evidências disponíveis até agora vêm de estudos conflitantes e controversos, e afirma que não enxerga motivos para abandonar a medicação.

Isso, claro, desde que as gestantes recebam orientações sobre o baixo risco de malformações. E que a prescrição seja feita quando outras medidas já falharam.

O que é a ondansetrona

O composto é usado há mais de dez anos no tratamento da náusea que aparece em pessoas submetidas à quimioterapia ou que se recuperam de uma cirurgia. Por se mostrar eficaz em casos severos, com poucos efeitos colaterais notáveis, começou a ser receitado para mulheres que vomitam excessivamente na gestação.

“O benefício nessa situação é muito maior do que um risco ainda teórico”, defende Carolina Burgarelli, ginecologista e obstetra da Maternidade Pro Matre Paulista.

Veja: antes da ondansetrona entrar em cena, o ideal é tentar medidas não farmacológicas ou drogas que estão há mais tempo no mercado e são considerados menos potentes, como Dramin e Plasil. Porém, vale lembrar que nem eles são inócuos. “Todo remédio tem um risco. Por isso é importante que a gravida não se automedique”, destaca Malavasi.

No momento, todas essas opções estão classificadas na categoria B de risco para a gravidez da Anvisa. As substâncias encaixadas aqui não apresentaram perigos ao feto em estudos com seres humanos.

A agência analisa a possibilidade de mudar a ondansetrona para a categoria D, onde há evidências de danos fetais, mas os benefícios podem, eventualmente, justificar tal ameaça.

Quando o enjoo é um problema na gravidez

Nessa fase, as náuseas são desencadeadas pela gonadotrofina coriônica humana (hCG), hormônio produzido aos montes no início da gestação. A substância compromete a eficiência dos movimentos peristálticos, que comandam reflexos como engolir, digerir e, de vez em quando, vomitar.
“Estimamos que até 85% das gestantes sofram com enjoos, sendo que 2 a 3% desenvolverão a hiperêmese gravídica, síndrome que provoca uma versão extrema dessa manifestação”, diferencia Carolina.

Nesse caso, as mulheres não raro precisam de internação, pois desidratam — o quadro chega a ameaçar a vida. Desequilíbrios nos sais minerais que levam à arritmia cardíaca e impossibilidade de se alimentar são outras consequências sérias dos vômitos constantes. E nem precisamos dizer que essas situações ameaçam o bem-estar do bebê. Daí porque tratamentos medicamentosos para conter náuseas intensas têm sua relevância.


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