quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

Colisão planetária que criou a Lua encheu a Terra de ingredientes para a vida

Há 4,6 bilhões de anos, nascia uma estrela chamada Sol. Isso foi um bocado de tempo atrás. Muito tempo mesmo. Imagine o seguinte: o repórter que vos fala tem 23 anos. Se a idade deste repórter for equivalente à distância entre São Paulo e Rio de Janeiro (430 quilômetros), então a idade do Sol é equivalente à distância entre São Paulo e Tóquio (18 mil quilômetros) – multiplicada por 4600000. Em resumo: é muito tempo. Mais do que dá para imaginar.

O Sol incorporou a maior parte da poeira e do gás que estavam nas suas redondezas. 99,9%, para ser mais claro. Mas esses 0,1% que ficaram de fora – as rebarbas, essencialmente – deram origem a todo o resto. Terra, Marte, asteroides e até o gordinho Júpiter foram todos formados a partir do disco de gás e poeira (chamado disco de acreção) que sobrou na órbita do Sol após seu parto.

Não precisa nem dizer que o tal disco de acreção era uma bagunça. Naquela época, os planetas ainda estavam interagindo em uma complicada dança gravitacional. Eles iam agregando mais poeira e mais gás, ganhando massa e disputando espaço entre si. Foi quando aconteceu algo inesperado. Na mesma órbita em que uma bolinha de pedra chamada Terra estava se formando, outra bolinha, chamada Theia, começou a se formar também. Ela ficou do tamanho de Marte.

E bem, órbita é que nem cidade do velho oeste: pequena demais para nós dois. Ou, no caso, elas duas. Theia se desestabilizou, entrou numa espiral estranha e se chocou com a Terra. Foi uma pancada difícil de imaginar. O asteroide que extinguiu os dinossauros tinha 150 km de diâmetro. Imagine o que não faz um “asteroide” de 6.600 km de diâmetro.

Essa pancada aniquilou Theia. Alguns de seus pedaços foram incorporados à Terra. Outros foram ejetados no espaço, se acumularam e formaram outro astro muito familiar: a Lua. Nosso céu ficou decorado para sempre com a cicatriz da tragédia. Você pode ver o processo resumido no GIF abaixo.

 

Agora, um grupo de astrônomos da Universidade Ryce, no Texas (EUA), descobriu que o choque com Theia pode ter fornecido à Terra grandes quantidades de elementos químicos como nitrogênio, carbono e enxofre – essenciais para as primeiras formas de vida, que surgiriam pouco tempo depois.

Até onde se sabe, a Terra, na época de seu nascimento, não era rica em ingredientes propícios à vida. Por muito tempo, pensou-se que esses ingredientes chegaram aqui exclusivamente à bordo de corpos menores – como meteoritos chamados condritos carbonáceos, que choveram feito granizo no planeta primitivo. O problema, grosso modo, é que a porcentagem de carbono presente nos tais condritos não bate com a porcentagem verificada na Terra hoje em dia. Esse descompasso é sinal de que os condritos não fizeram o serviço sozinho. Precisava existir uma fonte extra de carbono.

A equipe de Ryce, então, supôs que Theia foi a responsável por fornecer o carbono – uma suposição que posteriormente foi apoiada por diversas simulações da dinâmica do Sistema Solar primitivo, feitas com auxílio de um computador. “Nós descobrimos que todas as evidências (…) são consistentes com o impacto que formou a Lua, envolvendo um planeta do tamanho de Marte com um núcleo que contém bastante enxofre”, afirmou à imprensa o petrologista Damanveer Grewal, um dos participantes do estudo.

Comprovar essa hipótese dependeria de dados a que não temos acesso direto – como, obviamente, a composição química de um planeta que não existe mais. Ou seja: por enquanto, vamos ficar só na especulação. Mas é uma especulação não só provável como fascinante. Você pode até ser um terráqueo, mas também, de certa forma, é um ser de outro planeta.


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