sexta-feira, 17 de julho de 2020

Mexa-se para se proteger da Covid-19

Grupos de risco. Seis meses após o novo coronavírus ter dominado o noticiário e nossa rotina, você já deve ter alguma familiaridade com esse termo. No caso da Covid-19, estamos falando das pessoas mais velhas ou com alguma doença crônica como obesidade, hipertensão, diabetes, problemas cardíacos e respiratórios, entre outros. Em comum, quando elas são infectadas pelo vírus, seu organismo não consegue combatê-lo com tanta eficiência e, aí, os sintomas e as reações indesejadas pioram.

Mas, antes que você pense algo como “Ah, eu me cuido e não faço parte desse grupo”, tenha em mente que mais da metade dos adultos brasileiros (86 milhões de cidadãos) apresenta ao menos um dos fatores de risco para uma evolução grave da Covid-19.

Nesse mundo de gente, muitos nem sequer sabem que possuem um problema crônico — tem desde quem encare o excesso de peso como algo sem relação com a saúde até quem não desconfie da pressão ou da glicose elevadas porque elas são silenciosas. Mas estar ciente dessas questões, e ajustar o dia a dia para administrá-las, faz diferença até diante do coronavírus. Boa parte das complicações seria evitada se doenças prévias estivessem sob controle.

E uma das formas mais simples, eficazes e, por que não, prazerosas de prevenir ou domar tais condições é mexer o corpo. “Temos observado que indivíduos mais ativos se recuperam mais rapidamente da Covid-19 que os sedentários. Hoje é obrigação do médico recomendar fortemente exercícios para o controle das doenças crônicas”, afirma o cardiologista e médico do esporte Nabil Ghorayeb, do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, em São Paulo.

A lista de benefícios da prática regular de atividade física é extensa e tem bônus na pandemia. “Quando nos exercitamos, o corpo produz substâncias anti-inflamatórias, e isso é crucial se levarmos em conta que pacientes graves de Covid-19 desenvolvem um processo inflamatório intenso”, explica Antônio Lancha Jr., professor da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (USP). Botar o esqueleto em movimento não só ajuda a equilibrar a imunidade como trabalha o diafragma e os músculos intercostais, importantes ao sistema respiratório e na recuperação de um eventual ataque do coronavírus.

Se você já praticava alguma atividade, siga com ela, fazendo as adaptações necessárias. Caso contrário, ainda mais na presença de um problema de saúde crônico, consulte o médico antes dos primeiros passos e conte com um educador físico para orientar os treinos. Esse cuidado é bem-vindo para malhar respeitando suas particularidades e seus limites.

Falando neles, os especialistas não recomendam querer superá-los agora. Enquanto exercícios moderados melhoram nossa resistência a vírus e bactérias, treinos muito intensos podem comprometer o sistema imune — e o momento já não é dos melhores para isso.

Ao longo da reportagem, indicamos alguns caminhos para você controlar os principais fatores de risco da Covid-19 com a ajuda da atividade física e respondemos às dúvidas mais comuns de quem já está se mexendo ou pretende começar já.

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Pressão alta

Estima-se que quase um em cada três brasileiros tem hipertensão. Fora elevar o risco de infarto e AVC, o aperto nas artérias costuma estar associado a mais gordura e inflamação pelo corpo, um conjunto de situações que aumenta também o risco de casos graves de Covid-19. Além disso, infecções respiratórias podem demandar mais do coração. “E muitos hipertensos, assim como os cardiopatas, já apresentam as funções cardíacas comprometidas”, observa o professor Lancha Jr.

O papel dos exercícios

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A atividade física relaxa os vasos, melhora a circulação e fortalece o coração, além de controlar o peso e a glicemia. Os exercícios aeróbicos de maior duração e intensidade moderada (trote, corrida, bicicleta…) são os mais indicados. Não se esqueça de checar a pressão de vez em quando.

Cuidados especiais

“Faça intervalos mais longos, de 90 a 120 segundos, entre as séries de fortalecimento e evite exercícios isométricos de grandes grupos musculares por tempo prolongado”, indica Luciana Janot, cardiologista do Hospital Israelita Albert Einstein (SP). Se não se sentir bem ou estiver com a pressão descompensada, fale com o médico antes.

Dilema 1: Tenho de usar máscara quando caminhar ou correr pelas ruas?

Se houver a possibilidade de cruzar com outras pessoas, sim. Essa é a recomendação, mesmo que não seja obrigatório na sua cidade. Não há uma distância comprovadamente segura para se exercitar sem uma barreira como máscara ou balaclava. Mas atenção: quando a máscara fica úmida, ela perde parte da eficácia. Por isso, leve ao menos uma extra para trocar durante a atividade. E cuidado por onde pisa: o acessório pode reduzir seu campo de visão, dificultando que você note buracos e outros obstáculos na sua rota.

<span class="hidden">–</span>Ilustração: Marcus Penna/SAÚDE é Vital

Obesidade

O excesso de peso está ligado não só a uma imunidade menos afiada como a um processo inflamatório persistente — sem falar que anda de braços dados com diabetes e pressão e colesterol altos e reduz a capacidade respiratória. É um combo perigoso se pensarmos na Covid-19. Alguns estudos mostram que, tirando a idade, a obesidade é um dos fatores que mais pesam na hospitalização. Provavelmente a inflamação está por trás. O único remédio que já se mostrou capaz de diminuir a mortalidade pela doença, a dexametasona, sustenta a hipótese. Como ela age? Contendo a inflamação.

O papel dos exercícios

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“Além de reduzir o peso, a atividade física diminui um pouco a inflamação e melhora a resposta do corpo a infecções e a capacidade cardiorrespiratória”, resume o endocrinologista Bruno Halpern, do Hospital das Clínicas de São Paulo. Comece com atividades aeróbicas leves (como andar ou pedalar), aliadas a séries de fortalecimento muscular.

Cuidados especiais

É preciso evoluir gradualmente para não sobrecarregar articulações da coluna e do joelho. E, como geralmente pessoas acima do peso estão com pouco condicionamento cardiorrespiratório, devem interromper o exercício se sentirem falta de ar, dor no peito, palpitações ou suor frio.

Doenças cardíacas

Quem já teve um infarto ou convive com a insuficiência cardíaca deve redobrar os cuidados com a saúde — que incluem controle da pressão, do diabetes etc. O motivo também tem a ver com a inflamação a que o organismo já está mais exposto. “Na Covid-19, a inflamação pode fazer com que placas obstruam as artérias do coração”, descreve Cesar Jardim, cardiologista do HCor, em São Paulo.

O papel dos exercícios

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Os aeróbicos trabalham a capacidade cardiorrespiratória e ajudam a controlar a inflamação e outros fatores ruins para os vasos e o músculo cardíaco. Caminhada, corrida e bicicleta, em intensidade moderada, são bem-vindas. Nabil Ghorayeb indica uma proporção de 70% de treino aeróbico e 30% de resistência (como musculação).

Cuidados especiais

O ideal é que a rotina de exercícios seja liberada e estabelecida junto a um médico, que antes vai solicitar exames cardiológicos para dar esse aval. Em alguns casos, será preciso começar em ambiente supervisionado, com o uso de um monitor cardíaco.

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Doenças renais

Os portadores de doenças renais crônicas estão mais sujeitos a complicações por não produzirem direito hormônios como a eritropoietina, que participa da formação dos glóbulos vermelhos, além de, em alguns casos, terem condições como diabetes e uma imunidade reduzida. Quem fez transplante de rim toma remédios que diminuem ainda mais as defesas.

O papel dos exercícios

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“Eles melhoram as funções renal e muscular e reduzem fatores de risco cardíacos associados ao problema”, diz Leda Lotaif, nefrologista do HCor. Também ajudam a segurar diabetes e hipertensão, que causam lesões nos rins. Os experts sugerem uma combinação de exercícios aeróbicos e de força, totalizando ao menos 150 minutos semanais.

Cuidados especiais

A princípio, todo doente renal pode se movimentar, até durante a diálise (mas mexendo pouco o braço com o acesso). E é evidente que nesse contexto a supervisão profissional conta pontos. Se houver anemia, a recomendação é tratá-la antes de iniciar os treinos.

Dilema 2: Dá pra fazer exercício aeróbico em casa?

Com certeza! O treino aeróbico é aquele que usa o oxigênio como fonte de energia e recruta grandes grupos musculares. E você não precisa de muito espaço ou vários equipamentos. O importante é elevar a frequência cardíaca. “É possível montar um circuito com atividades como a corrida estacionária [no lugar] ou pela casa [só tomando o cuidado de ir invertendo o sentido], pular corda, fazer polichinelos, deslocamento lateral e agachamento com salto”, lista Renato Carvalho, especialista em treinamento funcional e diretor da assessoria esportiva Integrando, em São Paulo. Vale a pena personalizar o treino com um profissional.

<span class="hidden">–</span>Ilustração: Marcus Penna/SAÚDE é Vital

Diabetes

Quando a glicose está fora de controle, o corpo padece. Altos níveis diminuem as forças do sistema imune e há maior risco de inflamação e entupimentos pelas artérias. São circunstâncias que aumentam a propensão a panes com o coronavírus — ainda mais porque, como se sabe, a infecção pode causar problemas de coagulação. Tudo isso convida os diabéticos a monitorar a glicemia com frequência, tomar os remédios como o médico prescreve, cuidar da alimentação e se engajar em exercícios aeróbicos e resistidos.

O papel dos exercícios

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Eles fazem parte do tratamento porque o corpo usa a glicose como combustível durante e até 12 horas após o treino. “Os aeróbicos de longa duração e intensidade moderada são bem eficazes. E, para os mais condicionados, o HIIT (treino intervalado de alta intensidade) traz benefícios até 24 horas depois do treino”, conta o educador físico Emerson Bisan, de São Paulo, que é ultramaratonista e diabético.

Cuidados especiais

Há dois riscos a administrar: a taxa de açúcar no sangue subir demais (acima de 250 mg/dl) ou despencar (abaixo de 70 mg/dl), o que pede para abortar o treino. Se houver hipoglicemia, recorra a sachês de açúcar ou gel de carboidrato. Com dieta e tratamento adequado, o risco de isso acontecer diminui.

Problemas respiratórios

Pensando na Covid-19, os mais vulneráveis são os portadores de DPOC, a doença pulmonar obstrutiva crônica. “Isso porque uma das complicações é justamente a pneumonia, que agrava a situação dos pulmões”, explica Letícia Kawano, doutora em pneumologia pela USP. A asma, se bem controlada, não traz riscos adicionais. Já os casos graves, com sintomas diários e histórico de internação, sim.

O papel dos exercícios

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A prática regular aumenta a produção de enzimas que resguardam o sistema respiratório, trabalha a musculatura do tórax e tem ação anti-inflamatória. Treinos aeróbicos e resistidos são indicados a pessoas com DPOC, enquanto asmáticos podem focar em caminhadas, pedaladas…

Cuidados especiais

Principalmente nos casos mais sérios, os treinos devem ter supervisão no início e, então, o paciente ganha autonomia. É preciso evitar ambientes muito poluídos, ar frio e seco e treinos superintensos. Pessoas com asma devem sempre ter a bombinha por perto por precaução.

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Imunidade em baixa

Falamos dos imunodeprimidos, pessoas em tratamento contra HIV, câncer e algumas doenças autoimunes. Neles, a capacidade de defesa em relação aos invasores como vírus e bactérias é prejudicada, às vezes como efeito colateral dos remédios. Como a Covid-19 pode evoluir mais rápida e gravemente aqui, não dá pra negligenciar o isolamento social e uma rotina saudável.

O papel dos exercícios

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“A atividade física ajuda a manter o sistema imune em equilíbrio e beneficia os sistemas nervoso e cardiovascular ao reduzir o estresse”, destaca o imunologista Alberto Duarte, do HCor. São vantagens para esses pacientes, que podem aderir a treinos aeróbicos e de força, de preferência em casa e com orientação.

Cuidados especiais

É melhor evitar esforços intensos e/ou prolongados justamente pelo efeito de baixar a resistência — isso vale ainda mais para aqueles sem condicionamento físico. “O exercício exagerado vai gerar processo inflamatório, e isso é tudo que não queremos agora”, frisa Duarte.

Dilema 3: Afinal, há um melhor horário para se exercitar?

O melhor momento é aquele em que você consegue treinar. Isso porque o segredo para colher os benefícios da atividade física é regularidade. “Precisamos ter disciplina e comprometimento e ver o exercício como um compromisso inegociável”, afirma o educador físico José Carlos Fernando, diretor da assessoria esportiva Ztrack, na capital paulista. Para muita gente, esse horário é o da manhã, antes que as outras demandas do dia (almoço, reuniões online, aulas dos filhos…) sabotem os planos. Se for se exercitar na rua, evite horários de pico, tanto para escapar do excesso de poluição como pela sua segurança.

<span class="hidden">–</span>Ilustrações: Laura Luduvig/SAÚDE é Vital

Mexa-se para se proteger da Covid-19 Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br

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