As fotos da imensa fila para subir no pico do Everest viralizaram na última semana. Não é à toa – ninguém imagina que existam tantas pessoas dispostas a enfrentar um dos maiores desafios da natureza. Ar rarefeito, falta de oxigenação no cérebro e extremo esforço físico são apenas alguns dos obstáculos que os alpinistas precisam enfrentar.
Apesar da grande repercussão das fotos, o grande número de mortes recentes por lá não aconteceu devido à fila gigantesca – ou à cultura de selfies radicais que ajuda a alimentar essa fila. O buraco está mais embaixo. Nesta temporada de escalada, iniciada em abril, um grande número de alpinistas inexperientes decidiu enfrentar o desafio.
Para subir o Everest, você pode começar a escalada pelo lado da China ou do Nepal. Os dois países devem conceder uma permissão ao alpinista. Enquanto a China é mais rigorosa e exige atestados de experiências prévias em escaladas, o Nepal pede apenas alguns documentos e comprovação de boa saúde.
Em 2019, o Nepal bateu recorde de permissões para escalada. Foram 381 autorizações ao custo de 11 mil dólares cada uma. Os alpinistas se concentram no período da primavera — abril e maio —, quando as condições estão mais favoráveis.
Cada vez mais, escalar o Everest é encarado como uma atividade turística. Na última década, surgiram companhias locais nepalesas dispostas a receber uma grana para assumir o risco que é levar pessoas menos experientes na empreitada.
O despreparo de parte dos aventureiros é a grande causa das mortes recentes. O corpo humano tem dificuldades para sobreviver acima da altitude de 2500 metros. A maioria das pessoas começa a sentir cansaço, dor de cabeça e enjoo nessa faixa de altitude. O Everest, por sua vez, possui 8.848 metros de altura.
A situação começa a piorar mesmo quando os alpinistas chegam na “zona da morte”. Ela fica a 8 mil metros do chão. A partir daí, a maioria das pessoas precisa usar tanques de oxigênio para chegar ao topo e deve descer o mais rápido possível para sobreviver. Qualquer impedimento que atrase o trajeto pode ser fatal — seja ele uma tempestade de neve ou uma fila de pessoas.
Os alpinistas inexperientes levam oxigênio o suficiente para aguentar a subida — mas não a descida. Sem oxigênio, o cérebro fica comprometido, levando o indivíduo a tomar decisões ruins e ter menos coordenação motora. Isso pode levar a um erro fatal, como cair de um morro ou decidir sentar para descansar no meio de uma inclinação. Se o alpinista com pouco oxigênio decidir sentar, pode ser que ele não tenha forças para levantar e morra congelado.
Para piorar, as pessoas nessas situações podem sofrer com edemas cerebrais causados por grandes altitudes. Nesse caso, todos os sintomas da falta de oxigênio são maximizados e a pessoa começa a agir como se estivesse embriagada. Nem é preciso dizer que juntar alguém “bêbado” com um dos lugares mais perigosos do mundo não é uma boa ideia.
Além do cérebro, o ar rarefeito também prejudica o pulmão. Um dos sintomas mais apresentados pelos alpinistas é a “tosse Khumbu”. Ela é causada pela baixa umidade e temperatura, típica dos lugares mais altos da Terra. Ela provoca uma tosse tão forte que pode chegar a fraturar as costelas dos montanhistas. Eles também podem sofrer de edema pulmonar, quando os pulmões estão tão comprimidos e tensos que as paredes capilares começam a vazar e encher os órgãos de líquidos.
O próximo órgão que mais sofre com os efeitos da altitude é o coração. Quando os alpinistas mais novos morrem repentinamente ou durante o sono, a causa pode ser arritmia. Nos mais velhos, é provável que seja ataque cardíaco. Em lugares como esse, o nosso corpo encontra-se em condições extremas — e pessoas com problemas cardíacos que ainda não foram diagnosticados sofrem um risco a mais.
Apesar das milhares maneiras diferentes de morrer no Everest, é difícil cravar com certeza a causa de cada uma delas. Como é de se esperar, as informações de um dos lugares mais remotos da Terra chegam aos poucos. Na maior parte dos casos, os corpos são deixados no mesmo local em que a pessoa morreu — tanto pela dificuldade de trazê-los de volta quanto pelo significado dado ao local de morte do alpinista. Assim, não há como fazer autópsias ou estudos aprofundados sobre o tema.
As multidões e filas no Everest não são responsáveis diretamente pelas mortes — mas elas definitivamente aumentam os riscos. O uso de técnicas pouco adequadas apresenta perigo tanto para os inexperientes quanto para os veteranos. Elas atrasam o tempo de subida de algumas pessoas e consequentemente todos que estão atrás delas. E no lugar mais extremo do mundo, cada momento é crucial para a sobrevivência.
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